19.5.09

Madrugada desgraçada

Dra. Mar,

noite passada, após a habitual luta diária contra a insônia, consegui finalmente pregar os olhos às 2 da manhã. Televisão, computador, rádio, cérebro, tudo desligado. Deitei e fechei os olhos, pronto para encerrar mais um dia miserável igual a todos os outros.

Mas é claro que essa história não teria a menor graça se fosse apenas isso. Não, cara doutora, a desgraça é uma companhia teimosa e inconveniente. Poucos minutos após ter encostado o encéfalo cansado no travesseiro puído começo a sentir uma coceira chata no antebraço esquerdo. Não era uma simples coceirinha. Era uma daquelas. Inchou muito rápido. Enquanto ainda coçava a primeira veio a segunda picada. A terceira. A quarta. Era um ataque! Arremessei o cobertor longe, temendo pulgas, e comecei a me coçar inteiro, maldizendo a mim mesmo por não ter um pote de calamina ou algo que o valha por perto. Acendi a luz e descobri que o problema não eram pulgas, mas pernilongos. Um enxame deles! Corri para a área de serviço. Iria terminar a emboscada pernilonguífera com doses maciças de insecticida. Peguei o spray e, quando estava pronto para substituir toda a atmosfera de meu quarto em uma nuvem venenosa lembrei-me de minha gata. Queria matar mosquitos, mas não ela. Não ainda. Ela tem sua utilidade. Não sei bem qual, mas que tem alguma, isso tem.

Toca procurar a Nanda.

Encontrei-a embaixo do guarda-roupa, roncando de boca aberta. Sem muita paciência (lembre-se: eu estava me coçando inteiro) puxei-a e a coloquei no colo. Meu plano era simples: com a gata no colo eu passaria insecticida. Depois nos abrigaríamos no banheiro até a nuvem tóxica se dissipar. Simples assim.

Só esqueci de um simples detalhe: gatos e sprays não se dão exatamente muito bem juntos. Assim que apertei a válvula do insecticida e o primeiro tisss... se fez ouvir, a Nanda se transformou imediatamente num demônio da Tasmânia. É, igual ao desenho. Uma nuvem de garras, dentes e pêlos dilaceraram meu braço, peito e pescoço. Derrubei a lata e a gata ao mesmo tempo, berrando e sangrando. A lata rodopiou pelo chão até se esconder debaixo da cama. A Nanda se desmaterializou como por mágica. Acho que acordei a vizinhança inteira com os xingamentos. Fui no banheiro e estanquei o sangue o melhor que pude (com pedaços de papel higiênico e toalha, pois os bandêides tinham terminado). Com metade do corpo coberto de trapos higiênicos, saí em busca da maldita felina. Não para matá-la, como deveria, mas para prendê-la no banheiro. Fiquei imaginando os pernilongos vendo todo aquele sangue em mim e babando como moleques de rua ao verem uma pilha de crack. Mesmo assim levei absurdos 45 MINUTOS para conseguir capturá-la, tão arisca ela estava após o susto. Desgraçada. Eu que deveria estar assustado. Cão do nono círculo do inferno. Agarrei-a pelo cangote e prendi-a no box do chuveiro. Em seguida esvaziei a lata de insecticida no quarto inteiro e me tranquei no banheiro. Esperei lá por quase duas horas, até que o cheiro de veneno se dissipasse.

Saldo da bisonhice: só consegui deitar efetivamente já passava das 5 e meia da manhã.

Desliguei o despertador e usei as últimas ideias coerentes para inventar uma desculpa para faltar no trabalho hoje. Não consegui inventar nenhuma boa, mas dormi assim mesmo.

Acordei às 8 da manhã com a voz de minha mãe me dizendo: "Ei Lobo, não tem um pão aqui. Vai comprar!" Meia hora depois estava eu no supermercado, comprando pão como um zumbi. Peguei uma fila monstruosa para pagar a compra mirrada. Quem além de alguém completamente desesperado vai ao supermercado às 9 da manhã?! Ou o mundo está povoado por desesperados ou há poucas esperanças para a humanidade. Mas divago.

Voltei pra casa e já passava das 10. Entreguei o pacote e peguei minhas coisas, resignado a ter que ir trabalhar com pouco mais de 2 horas de sono mesmo, quando a mãe me pergunta:

- Lobo, a gata tá trancada no box por alguma razão? Ela tá miando que nem uma louca...

Putz, a gata! Resisti ao primeiro impulso de ir lá libertá-la e, olhando para as feridas em meu braço e lembrando da dor da noite anterior, sentenciei:

- Deixa ela lá. Ela merece. Se começar a desidratar liga o chuveiro e tá tudo certo.

Eu poderia enquadrar a expressão de minha mãe e olhar todo dia antes de ir pro trabalho. Clássico.

Se alguém da APA* ligar aí, você não me conhece, hein?

* Associação Protetora dos Animais

Um comentário:

Unknown disse...

Que noite hein... quando algo tem q dar errado...=/